Depois de quase um ano em regime de trabalho remoto por conta da pandemia de covid-19, muitas empresas entenderam que o modelo veio para ficar. Afinal, para diversos setores e funções, ficou provado que é possível manter os negócios girando e gerando bons resultados com os colaboradores atuando à distância.
Mas é importante estar atento e rever constantemente o modo como estamos fazendo home office na pandemia, que vem deixando muitos profissionais sobrecarregados, exaustos e infelizes. Por exemplo, em uma pesquisa da Oracle em parceria com a empresa de consultoria e pesquisa de RH Workplace Intelligence divulgada no fim do ano passado, 85% dos respondentes disseram que problemas de saúde mental relacionados ao trabalho afetam a vida doméstica, os relacionamentos, a qualidade do sono e da alimentação.
É verdade que, de toda a sobrecarga emocional que os profissionais estão recebendo desde o começo da pandemia, não dá para separar exatamente o que se deve à dinâmica do trabalho e o que vem de fatores ligados à covid-19, como o medo de ficar doente e a perda de pessoas queridas. Mas aspectos ligados à rotina em home office, como a perda de interações presenciais e o excesso de reuniões por vídeo, certamente se somam para demandar esforços de adaptação do cérebro, afetando também o corpo, o comportamento e a entrega ao trabalho.
Em situações de estresse, o hipotálamo, no cérebro, aciona a liberação dos hormônios adrenalina e cortisol, que colocam o corpo em situação de alerta, provocando uma série de reações físicas (aumento da pressão arterial, da frequência cardíaca e do ritmo da respiração) e cognitivas (distração, “brancos” e dificuldade de raciocínio podem surgir como reação no hipocampo, áreas associada à memória). Quando esse estado se torna crônico, prejudica a resistência do organismo contra inflamação e aumenta a predisposição a doenças físicas (como de pele e cardiovasculares) e emocionais (como depressão e transtornos alimentares).
Diante da possibilidade de o home office se tornar permanente em muitas organizações, gestores e profissionais de RH precisam reforçar o cuidado com as equipes e agir no sentido de facilitar a rotina de trabalho do empregado em casa. Por exemplo:
Usar videoconferências com consciência
Uma das principais reclamações de quem está em home office é o excesso de reuniões por vídeo, muitas vezes sem necessidade e quando o assunto poderia ser resolvido em um telefonema ou troca de e-mails. Um estudo realizado entre abril e maio de 2020 pela Microsoft com mais de 2 mil profissionais em regime de trabalho remoto em seis países comprovou o que ficou conhecido como “fadiga do Zoom”: o cansaço mental causado pelo tempo excessivo em reuniões por videochamada. A pesquisa utilizou um equipamento para monitorar a atividade cerebral de voluntários trabalhando e descobriu que o padrão de ondas cerebrais associadas a estresse e ansiedade foi mais alto durante videoconferências do que em tarefas sem essa interação, como escrever e-mails ou realizar tarefas individualmente.
Ainda de acordo com a pesquisa, a capacidade de atenção diante da tela atinge um pico por volta de 30 a 40 minutos após o início da reunião, caindo bruscamente em seguida. Isso acontece porque, como só vemos o rosto do interlocutor, nas conversas virtuais o cérebro precisa gastar mais energia na busca de sinais não-verbais necessários para estabelecer a comunicação, mas que são sutis online, como a linguagem corporal e o contato visual. Daí a sensação de fadiga mental.
Para piorar, reuniões e conversas mediadas pela tecnologia não têm a fluidez das presenciais – as ferramentas podem travar, o feedback não é imediato, o diálogo pode sair truncado, exigindo esforço extra do cérebro, aumentando o cansaço e prejudicando a concentração.
Manter a conexão com o time
Aquela conversa informal no café, a troca de ideias com o colega da mesa ao lado, a rádio peão. Tudo isso deixou de existir para quem está em home office. O problema é que essas interações espontâneas engajam áreas do cérebro responsáveis pela linguagem e comunicação, emoções e competências como resolução de conflitos e tomadas de decisão. São, portanto, oportunidades preciosas de troca, formação de novos vínculos e colaboração e, sem elas, perde-se espaço para criatividade e inovação.
De acordo com a mesma pesquisa da Microsoft, a desconexão com os colegas foi considerado pelos brasileiros o segundo fator mais estressante do trabalho remoto – atrás apenas do medo de contrair o coronavírus.
Faz sentido. A privação prolongada de contato social altera os níveis de serotonina e dopamina no organismo, substâncias que entregam sensação de bem-estar e motivação.
Há, ainda, os obstáculos que podem impedir uma boa comunicação quando ela se dá exclusivamente via ferramentas digitais – pense em mal-entendidos, mensagens truncadas e potenciais conflitos em conversas por mensagem de texto, por exemplo –, fazendo o cérebro se esforçar mais para compreender e até refazer tarefas.
Não esquecer que pausas são fundamentais
No escritório físico, os momentos informais de socialização também representam pausas necessárias para que o cérebro se autorregule entre tarefas e reuniões e continue funcionando com eficiência. São fundamentais, por exemplo, para normalizar a dinâmica do neurotransmissor acetilcolina, que atua no hipocampo, nos processos de atenção e memória, e também no córtex cerebral, responsável por funções como reflexão e resolução de problemas.
Muitos trabalhadores, no entanto, relatam que vêm emendando uma reunião virtual na outra, quando não entram em duas salas ao mesmo tempo e fazem o que podem para ninguém perceber. Quando veem, estão há horas diante da tela, sem levantar nem para beber água ou ir ao banheiro. Além de perderem capacidade de concentração, no final do dia sentem-se exaustos.
Veja como repensar a rotina em home office par otimizar o trabalho sem sacrificar a saúde física e mental dos funcionários:
1 – Limite a duração das reuniões virtuais (50 minutos é uma boa referência) e cuide para que sejam objetivas. Quanto mais denso o assunto da sessão, mais esforço cognitivo vai demandar dos participantes e, portanto, mais breve deve ser para que todos se mantenham focados.
2 – Aposte no planejamento detalhado das entregas de modo que não seja necessário realizar reuniões diárias para alinhamento de ideias ou feedback – algumas empresas já adotam uma ou mais pautas por semana sem reuniões. Estratégias assim também permitem que os funcionários se organizem para conseguir se dedicar a tarefas que demandam foco e atenção.
3 – Sempre que possível explore ferramentas de comunicação além do vídeo, como telefone, email, mensagem de texto ou áudio. Aplicativos de gerenciamento de projetos, como Trello e Slack, também podem ajudar a manter a equipe conectada.
4 – Avalie a possibilidade de um regime híbrido de trabalho para todos ou aqueles que gostariam de intercalar o isolamento do home office com alguns dias no escritório físico e a companhia de colegas.
5 – Atividades de team building (presenciais, quando possível, ou online) devem ser estimuladas para aprofundar as relações, reforçar o trabalho em equipe e aumentar o engajamento. Momentos de descontração à distância, como happy hours, festas, jogos e competições virtuais também.
6 – Incentive uma agenda de reuniões consciente: respeitando horários de início e fim das sessões, prevendo intervalos de pelo menos meia horas entre os encontros e obedecendo horários críticos como almoço e, se for o caso, jantar.
7 – Apoie a equipe na organização de uma rotina equilibrada, com espaço para atividade física e atividades prazerosas sem relação com o emprego. Exercícios físicos liberam endorfinas e outras substâncias que aliviam o estresse e contribuem para a eficiência do cérebro.
Realmente uma jornada a ser percorrida!
Espero estarmos juntos neste caminho!
Bianca Vilela.